“Fiz tudo que pude fazer em 2 anos na presidência”

Com quase 30 anos de serviços prestados ao Tribunal de Contas do Estado Amazonas, o conselheiro Érico Desterro, 50 anos, ingressou no TCE em 1985. Antes de integrar o colegiado da corte de Contas no ano de 2005, na vaga destinada ao Ministério Público junto ao TCE, exerceu dezenas de funções no Tribunal, entre elas a de assistente técnico, inspetor de controle externo, auditor assistente, chefe de gabinete da presidência e procurador. Nesta entrevista, além de falar de sua gestão à frente do TCE (biênio 2012-2013), dos avanços conquistados e ainda agradecer aos servidores pelo trabalho desenvolvido, o professor universitário Érico fala da tímida aplicação da Lei de Ficha Limpa, do que poderia ser feito para melhorar a atuação do TCE e ainda aconselha gestores públicos a investirem na capacitação dos servidores de carreira. Leia os principais trechos da entrevista concedida ao Departamento de Comunicação.

DECOM – O senhor é servidor de carreira do TCE e está por aqui há mais de 25 anos. Tem noção de quais funções não exerceu na corte?

Érico Desterro — Estou aqui há quase 30 anos. Em abril de 2015, eu vou completar 30 anos no Tribunal de Contas do Estado do Amazonas. Quais cargos não exerci? Realmente foram poucas as funções. Eu entrei no TCE no cargo de nível médio, era estudante da faculdade de direito. Fui chefe de gabinete da presidência, assessor jurídico da presidência, secretário-geral e depois passei no concurso do Ministério Público de Contas. Fui o primeiro procurador concursado do Tribunal de Contas, embora eu tenha entrado na mesma data que os procuradores Fernanda (Mendonça) e Evanildo (Santana), mas, como eu fui em primeiro lugar do certame, considero-me o primeiro procurador concursado da Corte. Depois, na vaga aberta pela aposentadoria do conselheiro João Braga, eu cheguei ao Tribunal Pleno (em abril de 2005) na vaga destinada aos membros do Ministério Público junto ao Tribunal. Não fui secretário-geral de controle externo porque salvo engano, não havia esse cargo, ele veio a existir depois de 1996, com a nova lei orgânica. Fui secretário-geral do Tribunal. Na época, dentro do controle externo haviam sete auditorias. O funcionamento do controle externo funcionava era de maneira diferente.

DECOM — O senhor sempre se colocou contra as críticas em relação a composição do pleno e as escolhas. Por que?

ED — Eu acho que é a composição correta, porque segue o que determina a lei. Primeiro que quem, majoritariamente, indica os membros para o Tribunal de Contas é a Assembleia Legislativa, no caso do Estado. É o Poder Legislativo que, por definição, é a representação da sociedade. Então, a indicação do Legislativo, na minha opinião, deve ser levada a sério. Alguns criticam que as indicações são políticas, não é? Ou ainda que seria melhor que o Tribunal tivesse uma composição mais técnica. Eu quero dizer que, hoje em dia, eu acho também. Não sou contra as indicações de caráter político, como se diz, mas hoje eu defendo — e sempre defendi —, que, talvez, a composição devesse ser mais técnica. Na minha opinião entendo que deveria haver, entre as vagas de conselheiro, uma destinada ao corpo técnico do Tribunal, assim como há uma vaga para os auditores, uma para membros do MPC. Penso que deveria haver uma vaga destinada aos servidores do Tribunal. Temos um ótimo quadro.

DECOM — O senhor é muito ligado à questão dos números, da produtividade. Qual a média de processos que julga por mês? E no ano?

ED — Por ano, eu não posso dizer porque eu retornei da presidência em janeiro deste ano, portanto ainda nem cumpri um ano depois disso. Não posso dar um número relacionado ao ano por enquanto, mas eu tenho apreciado mensalmente uma média entre 240 a 250 processos, mas o que é mais importante e o que diz respeito direto ao meu gabinete: eu tenho deixado menos de 20 processos todos os meses. Não há um único mês, nesses que já passaram, que eu tenha deixado mais de 20 processos para o outro mês. Em setembro passado, por exemplo, eu deixei oito processos pendentes para o mês seguinte.

DECOM — É difícil presidir o TCE?

ED — É difícil presidir qualquer órgão da importância do Tribunal de Contas, da relevância sobre o ponto de vista do seu orçamento, da sua atuação. Portanto, eu acho e entendo que é difícil, sim, presidir o TCE, diria que é desafiador. Há a necessidade de você ter um pouco de equilíbrio ao adotar as decisões, que vão definir o funcionamento do órgão também do período em que você não vai estar mais na presidência. Presidir também para os anos seguintes. Isso porque muitas coisas que aconteceram no seu mandato, evidentemente, aconteceram porque já havia decisões anteriores, acertadas. Nós precisamos fazer na presidência é corrigir, eventualmente, aquilo o que não está adequado à finalidade do órgão e também incentivar aquelas práticas que melhoram a corte, que colocam o Tribunal em uma situação de prestígio na sociedade. Digo isso porque todo órgão público precisa do reconhecimento da sociedade de que ele vale a pena existir, de que ele produz os resultados que a sociedade deseja. Nesse último aspecto, eu repito que dirigir o Tribunal, mais do que difícil, é desafiador. Entendi isso durante os 2 anos em que administrei a corte (2012-2013).

DECOM — O que falta para a instituição ganhar mais força?

ED — Eu acho que a valorização do servidor é um passo importante. Eu disse, ao fim da minha administração, que havia um novo desafio que era o de consolidar o quadro de servidores do Tribunal. Consolidar em que sentido? Tornar o nosso quadro mais profissionalizado, abrir concurso nas áreas que nós ainda temos deficiência. Eu entendo, por exemplo, que ainda temos deficiência na área de informática. Esse é um setor, hoje em dia, para as organizações públicas e privadas, um setor vital. Por meio do domínio da tecnologia, conseguimos dar pulos de produtividade, ganhos consideráveis de qualidade. Na próxima semana, o Tribunal de Contas irá receber um prêmio de qualidade (O TCE vai receber o Prêmio Qualidade Amazonas na categoria processo) exatamente focado nisto. A conjugação de dois fatores (o uso da tecnologia adequada e de algumas medidas de correção da forma de se atuar no tribunal) nos possibilitou que nós fôssemos agraciados com um prêmio no nosso segmento, o maior deles, reconhecendo que o Tribunal, no biênio 2012—2013, avançou consideravelmente no que diz respeito a qualidade das suas atividades, sobretudo no que diz respeito a resultados mais rápidos, a celeridade da nossa atuação. Nesse biênio conseguimos algo que nunca havia acontecido no Tribunal: reduzimos o estoque de processos pela metade. É um desafio constante de toda a organização: atuar de forma rápida e com qualidade.

DECOM — A Lei da Ficha Limpa deu uma visibilidade maior ao Tribunal de Contas, porque considerou que suas decisões serviam como item para considerar o político ficha-suja. O senhor acha que falta o quê para fortalecer ainda mais a corte?

ED — Sim, certeza absoluta. Primeiro porque a Lei da Ficha Limpa ainda está por ser aplicada adequadamente. As leituras que estão sendo feitas me parecem acanhadas, tímidas, não me parecem atender ao espírito dessa norma, que é afastar mesmo, para valer, da vida pública, aquelas pessoas que demonstraram não ter capacidade para estar na administração pública, quer por incompetência, quer por malversação de recursos. Então, eu entendo que a Lei da Ficha Limpa ainda está por ser completamente aplicada. Houve uma maior visibilidade dos Tribunais de Contas por causa da lei, sim, porém, há muitas outras coisas que o ordenamento jurídico poderia conceder ao Tribunal de Contas, utilizar a estrutura que o Tribunal e seu corpo técnico qualificado têm. Por exemplo: o TCE não tem a possibilidade de quebrar o sigilo fiscal e bancário dos agentes públicos. O TCE precisa muito do Poder Judiciário para dar andamento às suas investigações. A própria execução das decisões do Tribunal não pertence a ele, há dificuldades. Hoje, o sistema de execução das decisões do Tribunal de Contas é um sistema muito ligado aos próprios gestores, que estão sendo analisados pelo órgão, então fica muito difícil as coisas acontecerem de forma mais rápida e efetiva. A sociedade sente isso, embora não identifique as causas, e há sempre aquela solução simplista de colocar a culpa no TCE: “Ah, é porque este órgão não funciona”. Nós precisamos de mecanismos para que o Tribunal de Contas efetivamente consiga alcançar o que a Constituição reservou para ele como competência. Isso passa, evidentemente, por modificações legislativa, revisão de alguns procedimentos que devem ser adotados.

DECOM — Há uma discussão entre aplicações de multas altas e multas baixas aos gestores…

ED — A fixação da sanção deve ser feita com proporcionalidade. Mas, quanto aos valores desviados ou que o Tribunal considerou não comprovados, não há o que transigir. Se houve a identificação de que um certo valor, ainda que muito alto, a sua aplicação não está devidamente comprovada, não cabe ao Tribunal apenas glosar 10% ou metade, ele tem de glosar e determinar de todo o valor que considerou que não foi devidamente comprovado. Então é uma discussão que precisa, quanto às sanções, sim, precisamos ter razoabilidade, proporção, até para viabilizar, de fato, o cumprimento das nossas decisões.

DECOM — Sua gestão à frente da presidência (biênio 2012-2013) foi marcada, entre outras coisas, pela transparência e pela abertura à imprensa. O senhor acha que isso prejudicou alguma coisa?

ED — Em nada, eu acho que foi fundamental. Acho que o TCE elevou seu conceito junto à sociedade. Claro que ainda há incompreensões, problemas, e há razões, às vezes, para críticas sobre a atuação do tribunal, mas acho que a melhor maneira de tornarmos o Tribunal um órgão mais eficiente é fazendo essa aproximação com a sociedade, por meios de comunicação, com a sociedade civil organizada, viabilizando com que a sociedade conheça o Tribunal de Contas e uma vez conhecendo possa, efetivamente, fazer críticas pertinentes, mas sempre no sentido de melhorar a corte. É importante a sociedade saber o que o TCE está fazendo, por isso tentamos ser o mais transparentes possível.

DECOM — Qual o legado de sua administração na presidência?

ED — Acho que fortaleci o Controle Externo. Entendo que nós criamos mecanismos para o melhor funcionamento do Tribunal e é esse, no meu modo de ver, o objetivo principal de qualquer presidência, não só da minha, mas de todas. Porque nós não somos Secretaria de Obras, não somos Secretaria de Educação e nem de Meio Ambiente, somos o Tribunal de Contas do Estado do Amazonas e a sociedade espera de nós é que cumpramos com as nossas competências constitucionais, que é de fazer o controle. O legado de toda a presidência deve ser o seguinte: entregar um Tribunal cada vez mais eficiente e comprometido com a fiscalização correta e atual da coisa pública.

DECOM — Acha que poderia ter feito mais?

ED — Fiz o que conseguiria fazer em 2 anos. Como eu disse, o Tribunal não é uma Secretaria de Obras, nós nem temos estrutura para ficar fazendo obras, mas fizemos apenas aquelas obras necessárias para melhorar nossa atuação. A biblioteca, remodelamos o nosso prédio mais antigo para receber novos servidores aprovados em concurso e tivemos um acréscimo, por exemplo, dos estagiários. E também aquelas obras que ninguém dá muita importância, mas que são extremamente importantes: as relacionadas à segurança do prédio. Nós investimos grandemente em obras para o combate de sinistros. Os nossos prédios, antes da minha presidência, não passariam certamente numa inspeção do Corpo de Bombeiros e hoje estão devidamente equipados para isso.

DECOM — O senhor teria tempo para se aposentar, mas, em contrapartida, tem pelo menos 19 anos para chegar aos 70 anos. Pretende ficar mais tempo prestando serviço ao TCE?

ED — Não tenho a mínima ideia, vai depender de muitas coisas. De como o tribunal estará daqui a alguns anos, por exemplo.

DECOM — Como coordenador-geral da Escola de Contas Públicas, o senhor tem reclamado da participação dos gestores nos cursos oferecidos. O que está faltando?

ED — Interesse, acho eu. Nós fazemos divulgações e elaboramos uma programação de curso baseada nas próprias demandas dos jurisdicionados. Há exceções, evidentemente, porque há cursos aqui solicitados por eles que houve, de fato, um comparecimento considerável de pessoas. Há municípios interessados, mas há municípios que não têm nenhum interesse e, neste caso, eu só posso entender que a pessoa não está realmente interessada em ter um quadro de servidores tecnicamente qualificados.

DECOM — Teria uma mensagem aos jurisdicionados?

ED — A mensagem seria no sentido de que os gestores precisam buscar profissionalizar os servidores do órgão. Essa decisão atua a favor deles porque as contas são de responsabilidade, no fim, do chefe do Executivo, do presidente da autarquia. A responsabilidade perante o Tribunal de Contas é pessoal, é dele. Mas o gestor só conseguirá ter um bom desempenho na prestação de contas se ele tiver servidores que colaborem para isso. Ressalto que esses colaboradores a serem treinados não podem ser apenas os comissionados. O caminho é profissionalizar os servidores de carreira, porque são os responsáveis pela continuidade da administração, do serviço. Como eu disse, são eles que atuarão a favor do próprio gestor. Não tem como se ter uma boa gestão, se não tiver ao lado servidores altamente qualificados.

DECOM — Se pudesse reunir os servidores em um único local, qual mensagem daria a eles?

ED — De agradecimento. Em primeiro lugar, por tocarem o Tribunal de Contas. O Tribunal são os conselheiros, o corpo diretivo, as diretorias do controle externo, as secretarias, mas quem toca verdadeiramente o órgão são seus servidores, de uma forma geral. Então, a primeira palavra é de agradecimento e em seguida uma mensagem de esperança de que o tribunal cada vez melhore. Eu confio nisto: que o Tribunal está em uma rota de progresso constante, de evolução constante, não cabe mais nenhum período de retrocesso, nenhum período em que o TCE deixe de caminhar no sentido da eficiência e da efetividade de sua atuação.

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Entrevistador: Elvis Chaves/Fotos: Socorro Lins

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